quinta-feira, setembro 28, 2006

Aqueles que insisto que permaneçam...


O meu primeiro acordar, foi quando me apercebi que as coisas podiam ser diferentes daquelas que via de cima da varanda.

Era miúdo, e miúdo seria se o tempo não ousasse a empurrar-me meu quarto dentro, para ver o ocaso, quando desci as escadas, para partir de encontro com os outros.

Houve, no entanto, tempo para hesitar descer o ainda último lanço de escadas, tal como no primeiro voo.

As conversas risos e brincadeiras, desenrolavam-se em grande frenesim, mas o diálogo de olhares começava por ali, semeado entre as pedras da rua e os carros, que marcavam vírgulas disparatadas no discurso ocular. As posições retomavam-se, os diálogos restabelecidos, os domínios recuperados/perdidos, e cada um em disputa pela simpatia do líder, para voltar ao nível a seguir... “ Está tudo? Vamos (clap!) …”, e o jogo/aventura/riso/sangue decorriam, em frenesim.

No entanto, com o passar dos dias, viviam-se apenas dias de gargalhada geral, sem domínios nem dominados, reencarnando a animalidade quando alguém de fora aparecia. No fim, o silêncio imperava, como se fosse uma evocação à cumplicidade regada.

O domínio carnavalesco da animalidade humana só viria a surpreender uns dias muito largos a seguir, quando realmente a carne nua nos toca e sentes a tua a ir… onde o sorriso pueril volta em flash, entre a boca e a orelha, repousando no espanto… quando a única fuga é dares-te, até à tua finitude, e parece haver tanto espaço para tudo a mais…

Fomos entre abraços, pelos mesmos que fomos crescendo, sempre de sorriso fácil e alegria sem fim. Notávamos nos primeiros pêlos, os falsetes da voz do outro, e a textura dos dias que roçavam nas nossas mãos.


Houve então um dia, que todos nós quisemos em uníssono agarrar essa textura, para dali não sair, e no mesmo instante cada qual deu o seu salto quântico, em silêncio, fazendo-me perceber que há outras vertigens que aquelas que tinha na varanda.

São assim os amigos da infância… os de infância, são diferentes porém…

São aqueles que, no círculo, trocaram as mãos e quiseram (d)a mesma textura dos dias.

quarta-feira, setembro 27, 2006

Antecâmara da sincronia


"Desprendem-se os laços do pensamento, ficando para trás o passado como carruagem abandonada nos trilhos.

O presente invade-me as veias… estou síncrono.

Quem permanece deste lado?

Incrivelmente, alguns dos mesmos.

Incrivelmente, uma porção de desconhecidos.

- Tiramos o véu aos desconhecidos?

- Calma… deixa respirar fundo ainda…"

fragmento do diário íntimo de um fauno desconhecido

segunda-feira, setembro 25, 2006

Futuro Simples.


"- Quem faz a vigília pelos os amores desencontrados?

- A esperança de reencontrar o passado.

- Quem resolve os amores desencontrados?

- O futuro.

- Que futuro?!

- O simples, porque o condicional não serve a ninguém."

fragmento do diário íntimo de um fauno desconhecido

sexta-feira, setembro 22, 2006

Adeus... espera... mais um café?


A despedida triste: Olhares sorumbáticos com pinceladas de saudade convertida em sal, projecção de um encontro num futuro condicional, esperança de ovo oco, realmente esmagado.

Há tristes amantes que sonham um sonho reencontrado, na certeza – porque reconfortante – que o amor ainda existe entre ambos, com vida perene, mas cintilante suficiente, para desabrochar…

Porém, não sou um amante triste. Sou um amante vazio.

Todos os meus pisa papeis parti, que molham agora o chão como sonhos derramados, em sémen para um futuro lugar presente.

Sim, agora que já acabei por rasgar todos os postais ilustrados, resta-me coleccionar novos.

A esperança também este lado dócil e fácil: o tempo (a constante por excelência), todo Ele potência, viabiliza todos os desfechos, que variam ao som das nuances de estados de espírito.

Por outro lado, um novo prisma surge: o tempo é a constante… para quem?

Nós morremos, e ele continua. O tempo é por si só eterno, porque se insiste em contar, ou seja, quem cá fica insiste em contá-lo. Por ridículo que pareça, o tempo é eterno porque quantitativo. Soma-se sempre mais um nanossegundo ao segundo anterior, mais pleno agora (porque mais um pedacinho de tempo contado se junta), e assim linearmente, o traço do tempo percorre o espaço.

Mas não será a qualidade que conta? De que forma a qualidade vence a pretensiosa eternidade do tempo?

Porque existem dois tempos: o Tempo e o tempo-vento.

O Tempo é a constante matemática. Será sempre sublime, porque em nós não existe, apenas se aplica.

O tempo-vento é um intervalo do Tempo aplicado. E porque o interlúdio não passa disso mesmo, este pode mesmo assim aumentar ou diminuir, obedecendo a uma inconstante: o nosso livre arbítrio. Mas será sua qualidade suficiente para alcançar a eternidade?

Sabemos bem que não, mas mais vale viver pouco e bom, que muito e mau.

quinta-feira, setembro 21, 2006

Sobre ombro esquerdo


Nesta fuga desenfreada espaço-tempo fora, deixo devolutos, todos os fantasmas a quem lhes emprestava corpo e dava ardis. É difícil abandonar rotinas de pensamentos convulsos, cujos mecanismos são por demais conhecidos, que me vinham entretendo no caminho de idas e voltas, pois facilmente se pegava o fio à meada, reinventando-me no passado, com outra memória, com sentimentos requentados.

O pensamento obsessivo é um passatempo para não se pensar em nada de, realmente, novo.

Pensa-se e pensa-se numa outra perspectiva, do mesmo facto, da mesma vivência, como tudo ficasse resolvido nesse prisma chave, tal como na busca do Porquê dos porquês.

Aprendi – até há pouco – que nem tudo se consegue controlar, nem tudo tem porquês, e não há culpa não se ser sempre coerente.

Somos feitos de mudança e nunca um verso neo-realista teve tanta insinuação…

Os acasos, que um determinado acontecimento o fazem emergir, são impossíveis de serem totalmente controlados por nós… para os crentes, seria ser Deus. E mesmo que fossem, não seria por ter todas as explicações que viveríamos de fora do nosso passado; apenas ficaríamos com aquele travo na boca: há foi por isto que… Ah bom, ok!, o que é parco para quem deposita fé na resolução do problema passado, como via de viver os do presente, talvez, de forma inovadora.

Há coisas que aconteceram e eu sou resultado disso; e ainda bem.

Porém, porque hei-de ser sempre dessa rés, também?! Não me posso improvisar, aqui, no presente?

Quero perder o passado prolixo, largar pesos mortos, trazer os sobreviventes debaixo do abraço e viver aqui, agora, hoje… livre, sem dedos apontando para trás do ombro direito, enquanto desvio o olhar sobre o esquerdo…

segunda-feira, setembro 18, 2006

Futuro é ausente.


Abres mais uma vez o livro, onde os versos se tornam perversos, deturpação de sucessivas leituras, de uma realidade cada vez mais falsa e absurda.

Amar unilateralmente, como quem espeta o florete no ar, vazio de corpo, ausente de cópula.

Em todas as direcções lanças ataques, mas em nenhuma delas há corpo nem rasgos...

É equidistante o passado e o futuro, sendo ambos perto do presente. Lugar comum este equilíbrio; mas incomum seria a força de estender o presente no futuro. Não há vida no passado, apenas sobrevivência. E nessa situação apenas podemos andar em frente. Não faz sentido voltar a um ponto de partida que se finou em chegada.

Somos o real adiado, constantemente adiado.

“Porque não me amas?

Porque não te amo o suficiente?

Porque não sou opção? Que outras opções tens além de mim?....

Ah! já sei: no futuro…” – penso.

O futuro tem tudo. Lá habitam as serpentinas brilhos e os beijos… o fim da busca, o pousar das rédeas, o encontro com a esperança, o descanso final das cruzes, a defenestração dos terços partidos, o respirar fundo que pena por apneia… a paz inerte.


Porém, o futuro é ausente e a morte não é (hoje) opção.

sexta-feira, setembro 08, 2006

A cruz de ser quem se é.


"…porque sei que eu sou o fim de mim mesmo! Os outros estão longe de me esgotar!
Eu sou quem o pode fazer, só eu. Conheço bem a forma como premir a ferida, de a fazer chorar convulsa, aproximando-me do fim da dor de vida.

Eu sou o início/fim da minha vida!

Tenho o direito de viver dentro de mim.
Não ter de me defender dos outros, não ter de explicar aos outros, a pureza que também existe em mim."

fragmento do diário íntimo de um fauno desconhecido